All language subtitles for Blanche.Comme.Neige.2019.PT

BRANCA COMO NEVE

- Tudo bem, querida?
- Tudo bem.

Ainda bem.

Pedi mais ma��s.

N�o h� nenhuma.

- Pedi ma��s verdes hoje.
- Ma��s verdes, n�o.

O verde atrai o azar. � melhor se
forem vermelhas ou rosadas.

Pink Lady, por exemplo.
Adoro as Pink Lady.

Vou trocar por Pink Lady.

N�o voltaremos a usar as
toalhas dos Lambert.

S�o muito desonestos.

As Mercier n�o s�o mais caras
e duram muito mais.

Eu trato disso.

O teu pai dizia:
"� preciso saber fazer de tudo."

Tento fazer o meu trabalho
correctamente.

"Correctamente", que triste.

O teu pai n�o gostava de pregui�osos.

Tenta esquecer-te dos �ltimos
meses dif�ceis para n�s.

- Sai um pouco mais.
- Vou pensar nisso.

�s como uma filha para mim.

�s jovem, bonita.
Tens a vida toda pela frente.

Tenta desfrutar.

- Tudo bem, Claire?
- Tudo bem.

Queria dizer que...

Que...

� verdade que �s bonita.

Para ti, � pena.

Se n�o fosses t�o bonita,
eu n�o estaria aqui.

V�, fecha os olhos.

N�o vais sentir nada.

- Onde est� o meu fato de treino?
- Na m�quina de lavar.

Tirei-te a roupa.
Estavas encharcada.

Sequei-te com uma toalha.
Era necess�rio.

Como foste l� parar?

Ela morreu?

Eu � que fa�o as perguntas.

N�o sei, n�o fa�o ideia.

De algo, deves lembrar-te.

Lamento imenso.

Lamentas?

Fui ca�ar um javali.

Resultado: matei algu�m,
uma mulher. N�o � de lamentar...

Meti-me numa alhada
por tua causa, entendes?

- Vamos � pol�cia.
- Isso.

Conhe�o bem a cadeia.
Esquece a pol�cia.

N�o � o teu tamanho.

Chamo-me Pierre.

- Quando posso ir busc�-la?
- O qu�?

A minha roupa.

� isso o que mais te rala?
Quando secar, princesa.

- E at� l�?
- At� l�, n�o tens nome?

Claire.

A casa de banho � � direita.
Tens l� toalhas limpas.

Ol�, chegou � caixa de correio
de Maud Jacob-Guillaume.

Deixe a sua mensagem...

N�o pode ser.

N�o pode ser.

Onde est� a bomba da asma?
N�o pode ser. Francamente!

N�o foste tu?

Tenho asma e sinto
que a crise vem a caminho.

O que est�s aqui a fazer?
Como entraste?

N�o sei.

Gosto.

Gosto quando n�o se sabe.

Hoje em dia toda a gente sabe
de tudo. � o Google, a Wikip�dia,

essas idiotices, essas merdas.

Onde deixaram a bomba?

N�o vou ficar com uma espada
de D�mocles na cabe�a.

- O Vivaldi eras tu?
- N�o, o Vivaldi morreu.

Eu s� tocava a m�sica dele.

Pratico m�sica aqui h� tr�s anos.

Antes, estava na orquestra
de Grenoble. Foi l� que nasci.

Mas ficou imposs�vel morar l�.

� uma das cidades mais
polu�das de Fran�a, sabias?

- N�o.
- Agora j� sabes, Claire.

O nome fica-te bem.
Porque �s p�lida.

Gosto...

Gosto de mulheres p�lidas.

As carnudas...

aquelas de que gostavam Rubens
e Renoir, aterrorizam-me.

Desculpa.

Tudo bem, Chernobyl?

D�-me uma m�ozinha. Segura nele.
Tem andado em baixo.

Espero que n�o seja a Doen�a de Lyme.

Est� vermelho?
� contagioso para os humanos.

- Foste ao veterin�rio?
- N�o. Mas tu passaste-te?

Como assim?

Os m�dicos s� receitam o que as
empresas mandam receitar.

Desinfecta as m�os. Toma.

- Precisas disto?
- Com licen�a.

- Pronto, n�o � preciso tanto.
- Obrigada.

Tamb�m entre os dedos.

Assim.

O que est�s a� fazer?

- Quem �s tu?
- Fran�ois.

Faz o jantar.

Bem...

Precisamos de conversar.

N�o podes ficar aqui.

Porqu�?

Quem andava atr�s de ti
pode aparecer por aqui.

Ningu�m sabe que estou aqui.

Por enquanto.

Deixa-me ficar s� um pouco.

N�o � poss�vel.

N�o pedi para me salvares.

Mas salvaste-me.
E agora p�es-me na rua.

Sei que n�o tem l�gica,
mas n�o tenho op��o.

Certo.

- Agora, pira-te!
- Merda!

Merda.

Os g�meos n�o est�o?

Foram � serraria.

- Vem da�.
- Tamb�m vai sair?

Tens medo de ficar sozinha?

Tens claustrofobia?
Eu j� tive, mas superei-a.

Vou levar o c�o ao veterin�rio.
Vem comigo.

Sinto que est�s a passar
por uma fase complicada.

N�o te preocupes.

Eu sei guardar segredos.

Ent�o?

- O c�o est� bem.
- Est�s a brincar?

Ele est� acabado. Olha!

P�ra, ele n�o est� acabado.
Tu � que o deprimes.

Tenho antidepressivo para c�es.

- Certo. Entendi.
- Ol�?

Ench�-lo de medicamentos.
E depois?

� um produto natural,
feito de plantas.

- Mas s� amanh�, certo?
- Certo.

Amanh� vou ver as ovelhas
do Echenoz, ao lado de tua casa.

- Posso passar por l�?
- Podes.

Tamb�m est�s l�?

- Em casa.
- Estou.

Muito bem.

At� amanh�.

Ele precisa de comer bem.
Passeia com ele.

Por favor, brinca com algo alegre.

Est� certo.

- N�o entendi o seu...
- O meu nome? � Claire.

N�o, a sua liga��o...

O Vincent e a Claire est�o juntos?

- N�o, n�o...
- N�o, que ideia!

A Claire chegou ontem...

Nem sei como ela chegou aqui.

Um, dois, tr�s.

- Pronto.
- Cuidado, cuidado!

N�o quis ofender-te.

- Ofender-me?
- Quando...

Quando o Sam achou
que tu e eu...

Sou incompat�vel com mulheres.

Para que saibas.

N�o sou homossexual, n�o � isso.

Eu entendi.

Preferes a abstin�ncia
por causa da sa�de.

Est�s a brincar?

Mereci essa.

Para que me perdoes,
tomamos um copo na Georgette?

N�o digas que "n�o"
ou a� sim, ficarei ofendido.

E ent�o?

Pode ser.

Desculpa, mas tenho
de ir buscar umas partituras.

Entra.

- Ol�.
- Ol�.

Esta � a Claire.

Padre Guilbaud. Charles.

Meu Deus do C�u!

- Uma miragem.
- Calma, Charles.

Menina, diante de tal beleza e gra�a,
s� poderei curvar-me.

Que tolice!

Ajoelhar-me, tal como
os pastores diante da Virgem...

Charles, j� chega.

- � a �nica livraria da regi�o.
- Sim, claro.

Est� de f�rias aqui?
Visite a j�ia da nossa regi�o,

o Santu�rio de Nossa Senhora
de La Salette.

Conhecer� a incr�vel lenda
daquela que chora.

Posso ser o seu guia.
A ideia agrada-lhe?

N�o? N�o estou a ser chato,
� s� uma inicia��o...

� medita��o, ao recolhimento.

Charles, isso � quase uma blasf�mia.

N�o, nada disso.
Sem interesse nenhum.

E as minhas partituras?

Partituras? Claro, tenho-as aqui.
Desculpa.

Onde � que as deixei?

Obrigado.

"Gostas de Brahms?"

� para si, toma.

Obrigada.

N�o vou assedi�-la.

Tirando o exagero,
sou totalmente normal.

Talvez eu n�o.

N�o me conhece,
n�o sabe quem eu sou.

- Vais apresentar-me?
- Esta � a Claire.

�s a Georgette?

A Georgette deu-me um chuto
no cu h� tr�s anos. Sou a Muriel.

- Sa�de.
- Sa�de.

Por falar nisso, sempre foste
assim com a sa�de?

De nascen�a.
Passei a inf�ncia doente.

Tive de tudo.

Os meus pais davam-me coisas
bizarras que iriam curar-me,

mas, na verdade,
eram para me matar.

Foi a m�sica que me salvou.

Engra�ado.

- Achas engra�ado?
- N�o, mas...

Quando era pequenina,
a m�sica tamb�m era tudo para mim.

O violino.

Deixaste?

Isso � um crime.

Sabes, quando come�amos algo,
temos de ir at� ao fim.

Aos treze anos,
sofri um acidente de carro.

N�o fiquei ferida.
A minha m�e ia ao volante.

E ela...

Abandonei tudo.
N�o s� o violino, mas tudo.

Foi como se a minha vida parasse.

N�o queria mais nada.

O que disseste tocou-me.

Profundamente.

Mas isso foi antes.

Foi apagado...

... com uma grande borracha.

E agora...

sou uma p�gina em branco.

Toma.

Tenho uma coisa para ti.

� um instrumento de estudo.

Comprei em segunda m�o
e nunca o usei.

- Ele estava � tua espera.
- Agrade�o, mas n�o.

Fica com ele.

Nem sequer sei tocar, por isso...

Obrigada.

- Resolveste lev�-la � cidade?
- E ent�o?

Era preciso exibires-te?

Todos saber�o que est�
uma mulher aqui. Parab�ns!

Queres que v� embora?

Gosta bem passada?

Um pouco.

Obrigada.

O sal, por favor.

Quem ser�?

Como est� ele?

N�o melhorou.

Trouxe a medica��o.

Coloca uma c�psula na comida
dele a cada refei��o.

Mas com a��car.
� amargo.

- Certo?
- Certo.

- Vou comprar a��car.
- Mas s� �s refei��es.

Vou dar antes para o acalmar.

- Entendes?
- Entendo.

Vem da�, Chernobyl.

- Isso.
- Vem da�.

� sempre a mesma hist�ria.
O c�o est� �ptimo.

E tu...

Vieste para aqui para trabalhar?

De f�rias?

Nem um nem outro.
Calhou.

Calhou bem, ent�o.

E tu?
Trabalhas aqui h� muito tempo?

H� tr�s anos.

H� tr�s anos.
Bem, sou de M�con.

Tinha uma cl�nica l�.

Estava bem.

At� me aparecer uma mulher.

Marcou uma consulta
para castrar o gato dela.

Algo banal na tua profiss�o.

Sabes o amor � primeira vista?

- J� te aconteceu?
- N�o.

Sorte a tua.

Nem sei por que disse isto.

N�o devia dizer porque faz-me mal.

Est� tudo bem e calmo,
tal como � preciso.

Nada de stress nem de obsess�es.

- Sem paix�es.
- Uma paix�o saud�vel.

A cidade estraga as pessoas.

Deixa-as gananciosas,
hist�ricas e insaci�veis.

Est� provado.

Garganta seca.
Quer... beber...

Fran�ois?

O Pierre n�o pode saber.

Tu �s doente!

Eu sei que n�o devia,
mas n�o resisti.

Devias ter-me avisado.

Est�s zangada comigo?

Foste longe demais.

Consegues perdoar-me?

- N�o tem piada.
- Pois n�o.

N�o podemos contar. �...

Est� tudo bem?

Est� branca como um
cume com neve.

Foi a mota, achei que...

Assustei-me.

Tenho um �ptimo ch� de Yunnan.

Vai ajud�-la.

Suba.

- N�o teme a Deus?
- N�o.

Mas tem alguma coisa.
Deu para ver na cara.

Uma aura.

Um halo que talvez s� eu veja,
que flutua sobre algumas pessoas.

Ele brilha ao seu redor.

N�o, n�o sou maluco.

Sou um pobre padre
que tenta acreditar em milagres.

Eu tamb�m devia acreditar,
uma vez que estou viva.

Estar aqui � um tipo de milagre.

Sabe, tudo que � dito aqui,
daqui n�o sai.

Se precisar de confessar-se...

- Vou voltar.
- Para onde?

Para a casa dos g�meos.
Moro l�.

E fodo com eles.

Por que me conta isso?

N�o � muito cat�lico, eu sei.
Mas aconteceu.

Antes, eu nem conhecia o desejo,
mas agora quero eu viv�-lo.

Isso � mau?

Cristo disse: "N�o julgues
e n�o ser�s julgado."

E, como sabe,
Ele gostava das pecadoras.

Sei.

E o senhor padre?

Eu o qu�?

Tamb�m gosta das pecadoras?

� claro.

Mas n�o do pecado.

- Bom dia.
- Bom dia.

Ainda precisa de algu�m?
Posso atender a clientela.

- N�o h� nada melhor?
- Preciso de trabalhar.

N�o a conhe�o, de onde vem
ou as merdas que fez.

N�o fiz merda nenhuma.

Seria apenas uma.

Maud?

Sou eu, a Claire.

SETE DIAS ANTES

Isso a� � um veneno.
Tenta a hipnose.

Vou pensar.

Estou h� vinte minutos � espera.

Desculpa, tive uns problemas
com o meu s�cio.

Temos de conversar.

Temos de ser sinceros.

Talvez, com a morte do meu marido,
n�o precis�ssemos mais de esconder.

Mas continuamos a esconder.

N�o me interrompas, por favor.

Eis o que quero dizer:

Isto est� mais fraco.

Sinto menos prazer.

Tenho menos...

... alegria ao teu lado.

Acho que precisamos de um tempo
antes de se estragar tudo.

N�o?

Achas mesmo?

O que achas tu?

O mesmo que tu.

H� meses que espero a cada
encontro nosso que a magia volte.

Acontece a todos os casais.

Durante um tempo,
achei que f�ssemos uma excep��o.

� verdade que o que t�nhamos
era extraordin�rio.

Mas tens raz�o.

�s mais forte e mais l�cida do que eu.

N�o sei encarar a realidade.

Ent�o, fiz-te um favor.

Sentes-te livre.

N�o... Sim, eu...

Est�s a tirar-me um peso de cima.

N�o quero perder-te.

Vamos cosneguir reinventar-nos.

Ver como podemos ficar juntos,
tentar de uma outra forma.

Que seja mais linda.

Desculpa.

O que foi? N�o, estou
numa reuni�o, mas diz l�.

N�o, o n�mero dele est� no meu carro.

Mando por e-mail depois.

Desculpa.

Apareceu um problema.

Vemo-nos no Domingo?
Isso n�o muda.

Mas � claro.

� a Claire.
Grave a sua mensagem.

Claire...

N�o consegui falar contigo.

H� semanas que quero
dizer-te o que sinto.

Eu...

Estou a ver-te agora.

T�o pura.

T�o linda.

Amo-te.

E se pudesse...

Est�s bem mais relaxada
do que da �ltima vez.

N�o estou relaxada.

Estou devastada.

Se quiseres libertar-te,

posso ajudar-te.

N�o quero libertar-me.

Quero que tudo volte ao que era.

Se isso � o que quer,
s� h� uma op��o.

Ela deve partir.

Posso arranjar forma de ela
ir embora.

Para longe.

Isso n�o chega.

Deve ser uma partida...

... definitiva.

Definitiva.

Neste pa�s, fala-se muito e faz-se pouco.

Eu fa�o. Sei fazer.

Fica assim durante dez minutos.

Reflecte.

Metade agora.

O resto, daqui a uma semana.
� mesma hora.

S� pode ser assim?

N�o h� outra forma.

Sabes, depois da nossa conversa,

fiquei com medo de perder-te.

A s�rio?

Sim.

Mesmo.

N�o � estranho a Claire n�o ter vindo
trabalhar nestes �ltimos dias?

N�o soubeste de nada?

Isto n�o � nada dela.

N�o � a primeira vez.

- � mesmo?
- �.

- J� aconteceu?
- J�.

Deve estar a sofrer.

Espero que a culpa n�o seja minha.

Por que haveria de ser?

Posso ter dito coisas
que ela tenha levado a mal.

O que lhe disseste?

Nada, parvo�ces.
Nem sequer me lembro.

N�o vamos falar disso.
Ela vai voltar.

Maud?

Sou eu, a Claire.

- M�s not�cias?
- Foi engano.

Ficaste estranha.

Eu?

Claire, este � o Cl�ment, o meu filho.

Supondo que � meu!

� um bom filho.
Vem ver-me quase todas as semanas.

Tenho uma mota, por isso, � f�cil.

Mas n�o � aqui ao lado.

Sem �lcool, s� para mim.
Ele n�o bebe.

Atleta?

Sim. � professor de karat�,
de Taekwondo,

e qual � aquela dan�a brasileira?

- Capoeira.
- Capoeira.

N�o fiques t�mido.

Ele n�o gosta de ser o assunto,
mas � um campe�o. Orgulha-te.

- Tu �s bonito.
- P�ra.

- Ele n�o � bonito?
- Por favor!

Poderia...

- Sobremesa?
- N�o, nunca. Caf�, por favor.

Uma dica: pergunta se estava bom
quando vier levantares a mesa.

Os clientes n�o querem saber,
mas a chefe quer.

Est� certo.

- Ela n�o � chata?
- Ela � gentil.

- Estou a incomodar-te?
- N�o, porqu�?

Porque sei que posso incomodar.

- S� pareces estar tenso.
- Mesmo?

Sonhei contigo a noite passada.

Sonho doce ou pesadelo?

At� come�ou bem.

Mas no fim foi doloroso.

Se estiveres livre logo � noite,
h� um bar aqui perto.

- � isso.
- Vais contar-me o teu sonho?

At� logo.

N�o.

N�o quero.

Ouve l�!

P�ra!

P�ra!

Vamos.

Sai daqui!

Est�s a tocar-me?

Est�s a tocar-me?

Pe�o desculpa.

- N�o, n�o!
- � isso que queres?

- N�o, n�o!
- � isso que queres?

Estavas colada a ele.
Foi nojento.

�s doido. E nem sequer
agradeceste ao Cl�ment.

- Ele salvou-te o coiro.
- Nada disso, eu ia virar-me.

S� fez aquilo para te impressionar.

Parece que funcionou.

Por que me trazeres aqui
se te faz t�o mal?

Tens raz�o.

Tamb�m tenho uma desculpa.
Sou adoptado.

Isso fragilizou-me a vida.

Fui mudo at� aos cinco anos.

Como Einstein.

� mesmo?

Mas n�o sou o Einstein.

N�o, mas �s mais bonito.

Deveria ficar radiante.

Por que isto magoa tanto?

Estamos quase l�.

N�o te incomoda ficar sozinha com
aqueles tr�s no meio do nada?

N�o.

N�o me incomoda.

Ainda bem, ent�o.
J� c� n�o est� quem falou.

Mas n�o � l� muito normal.

� normal eu estranhar, n�o?

Somos todos um pouco estranhos.

Conheces algu�m que seja
verdadeiramente normal?

N�o sei.

Talvez n�o.

Somos mais diferentes do que pensam.

Tu, por exemplo.

N�o me leves a mal,
mas achava-te mais forte.

Mas agora h� pouco
vi-te com outros olhos.

Fr�gil.

Quando dizes "fr�gil",
queres dizer "pat�tico"?

N�o.

At� gostei.

Podes repetir?

Gostei de ti.

Se eu me descontrolar,
ser� uma cat�strofe.

Uma cat�strofe, porqu�?

Isto � uma cat�strofe.

Magoei-te?

N�o estamos sozinhos.

�s meio louco.

N�o, nem um pouco.

Vais acordar a floresta inteira.

- Bom dia.
- Bom dia.

Posso ajudar?

Procuro um guia da regi�o.

Veio em peregrina��o?

Sim, mais ou menos.

Santu�rio de La Salette, imagino.
Vale a pena ver.

Infelizmente, � tudo o que tenho.

Sou ateu.

Mas tenho um amigo padre que diz
que estamos na regi�o dos milagres.

Bem, nos dias que correm,
tendo a acreditar.

� que, em meia-d�zia de dias,
tive duas apari��es.

Duas?

Sim, duas. Voc�...

A senhora tem a beleza de uma
madona do Renascimento italiano.

E uma jovem que veio aqui.
Era muito pura, muito misteriosa.

Ent�o, s�o dois milagres.

Ela deve gostar disto aqui.

� t�o raro assim?

N�o acontece nunca.

Lamento, s� tenho esse.

� o Santu�rio.

Pode recomendar-me um
lugar onde ficar?

Sim, h� quartos no Santu�rio.

Ol�, Padre.

Desculpe a demora.

O que posso fazer por si?

N�o vim aqui exactamente
para um retiro, mas sim...

Mas sim para procurar a paz.

Como todos n�s.

Na verdade, vim aqui para
encontrar a minha enteada.

Uma jovem muito fr�gil.

Fugiu h� uns dias.

Estou preocupada com ela.

J� n�o consigo dormir.

- Venha comigo.
- Obrigada.

O pai dela, o meu marido,
faleceu recentemente.

Ela ficou muito abalada.

Tenho medo de n�o ter
estado presente o suficiente.

Mergulhei na minha pr�pria dor.

Ela ficou zangada.

N�o quero assust�-la
ao chegar de repente.

Ela pode voltar a fugir.

Entendo o seu medo.

- Qual � o nome dela?
- Claire.

Eu conhe�o-a.
E posso ajud�-la.

Posso ser o intermedi�rio para fazer
as pazes com a sua enteada.

Estou � disposi��o.

Foi uma b�n��o encontr�-lo, Padre.

- Obrigada por ontem � noite.
- Sim.

- O que aconteceu?
- Nada.

- Onde vais?
- � casa de banho. Posso?

- Claire, posso mostrar-lhe uma coisa?
- Pode.

N�o tem a ver com m�sica,
mas � um autor que acho divinal.

� um ilustrador de primeira classe.

Veja como o tra�o � vigoroso.

Veja as pequenas figuras.

Parecem duendes.

Ou an�es.

Outro aqui.

- � um presente.
- Obrigada.

- Vais ficar aqui um pouco?
- Vou.

- Tens planos para logo � noite?
- N�o.

D�-me isso.

Em que est�s a pensar?

Que estou bem aqui convosco.

Espero que isto dure.

N�o aguento mais a m�sica dele.

N�o gostas de Bach?

N�o gosto de m�sica cl�ssica.

Ele que pare, ent�o.

Ouves isto, Chernobyl?

Eu sei.

- Bom dia, Claire.
- Ol�.

- � a subir.
- Um pouco.

- Quando voltas para casa?
- Em princ�pio, no Domingo.

- Tens namorada por l�?
- Porqu�?

Desculpa, n�o quis ser indiscreta.

N�o tenho namorada.

Sinto que te assusto.

- Pergunto-me se sou eu ou � geral.
- N�o!

S� n�o sou como o meu pai.

N�o ataco todas as mulheres.

Ele portou-se bem comigo.

Mas � um velho nojento.

Conhece-lo melhor do que eu.

N�o muito.

Claire!

Claire!

- Magoaste-te?
- N�o, n�o.

- Contei um segredo da outra vez.
- Aquilo dos g�meos?

Precisava de entender.
Era algo novo para mim.

E agora?

Fodi com outro homem.

N�o � a �nica a faz�-lo aqui.

Garanto-lhe.

N�o lhe passam pela cabe�a
as confiss�es que ou�o.

- As montanhas activam o sangue.
- S�o as montanhas?

Isso mesmo, s�o as montanhas.

Pretende vir ter comigo sempre
que tiver um encontro?

O que quer?

Que lhe d� a minha b�n��o?

Sabe por que faz isto?

� preciso uma raz�o?

Antes, n�o sabia o que era o desejo,
mas agora j� sei.

Ainda bem para si.

N�o precisa do meu apoio
para se divertir.

Divertir-me?

Isto n�o � divers�o.
� a vida.

Isto � errado?

Isto faz de mim
uma criatura do diabo?

O diabo anda por caminhos
bem piores do que o seu.

E anda mascarado.

E a menina � transparente
como a �gua pura e fresca.

- Eu, transparente e pura?
- E por que n�o?

A menina sente-se viva.
Ent�o viva.

Viva com tudo.

E como disse Santo Agostinho:

"Ama e faz o que quiseres."

Algu�m aqui busca a reconcilia��o.
V� com o cora��o aberto.

Para avan�ar para o futuro,
fa�a as pazes com o seu passado.

Vou lev�-la ao quarto dela.

N�o � preciso.
Ela est� aqui.

Est�s admirada?

Muito obrigada, Padre.
Pode deixar-nos. Obrigada.

Fiquei com tanto medo que tivesse
acontecido alguma coisa.

Como me encontraste?

A tua liga��o caiu.
Ent�o, localizei o telefone.

E aqui estou eu.
Mas conta-me l� as novidades.

� claro que acredito.
Mas estou boquiaberta.

Ent�o tu fugiste.

E o que aconteceu � mulher?

N�o sei.

Sem aquele acidente,
eu n�o estaria aqui.

S� algu�m doente faria algo assim.

N�o se conhece a escurid�o
da alma humana.

Mas j� n�o me atormenta.

J� nem penso nisso praticamente.

Mas n�o vais ficar aqui eternamente.

Est�o todos � espera que voltes.
E eu preciso de ti.

N�o consigo voltar
para minha vida de antes.

- Estou bem aqui.
- Mesmo? Neste buraco?

Isto n�o � um buraco.

Fiz muitos amigos.

Fizeste? Isso � essencial.

Mas n�o te preocupes.

N�o h� pressa.

Talvez eu tamb�m c� fique
por uns tempinhos.

Se tu quiseres, claro.

N�o perdi a esperan�a
em convencer-te a voltares.

BERNARD:
CONTA AS NOVIDADES

Tenho de voltar ao trabalho.

- Queres boleia?
- Quero.

BRANCA DE NEVE

Uma roda est� estranha,
o pneu deve ter furado.

- Podes ver a roda esquerda da frente?
- Sim.

Est� tudo normal com a roda.

H� algum problema?

Parecia que tinha um pneu furado,
mas afinal n�o.

Tem sorte em ter uma enteada t�o linda.

At� logo, ent�o.

Estou com pressa
para uma degusta��o de vinhos.

Vamos?

Vemo-nos em breve?

- Quando est�s de folga?
- Domingo.

- Apresentas-me a regi�o?
- Com todo o prazer.

- Fazemos um piquenique?
- � uma boa ideia.

Posso dizer-te uma coisa?
Pareces-me mais viva.

- Achas que sim?
- Acho.

Parece que essas prova��es
acentuaram a tua beleza.

- Est� tudo bem com o seu filho?
- Est�.

Na verdade, n�o.

Queria dar-te uma palavrinha.

Ele trancou-se no quarto.
E est� cada vez mais estranho.

Estranho como?

Leva a mal tudo o que lhe digo.
Sobretudo, se for sobre ti.

- Sobre mim?
- Sim.

Ele disse que tem vergonha
da forma como te trato.

O que fa�o eu de mal?

- J� passei dos limites contigo?
- N�o, nunca.

Eu disse-lhe isso,
mas ele n�o quer ouvir.

Ele est� obtuso e agressivo.

- N�o queres ir dar-lhe uma palavrinha?
- Posso ir, mas digo-lhe o qu�?

Para parar de me julgar.

Isso magooa-me imenso.

Vou l� quando sair.

Obrigado, Claire.

O que est�s aqui a fazer?

Est� tudo bem contigo?

Est�, estou muito bem.

Fui rude hoje de manh�.

- Pois foste.
- Mas tu tamb�m.

Pois.

- Ambos o fomos.
- Sim.

Podemos fazer as pazes?

� que eu gosto de ti.

Tu �s muito charmoso.

Mas tens de ter calma.

- Est� tudo bem.
- A s�rio?

- Sim, est� tudo bem.
- Muito obrigado.

Fiquei preocupado.

- Conseguiste ver aquele livro que te dei?
- Vi, sim.

Gostaste?

� diferente. Mas inspirador.

Sim, inspirador.

- S�o todas parecidas contigo. N�o achas?
- Em que aspecto?

No da crueldade.

Podes ser cruel, n�o te rias.

- Eu n�o. Mesmo.
- Sim.

Sei que tens uma natureza cruel,
s� te falta aflor�-la.

Charles, porte-se bem.

- Como assim?
- N�o.

Mantenha a postura.

Sim, tenho de me portar bem
ou serei castigado.

- N�o � isso...
- Castiga-me.

- N�o.
- Eu mere�o.

N�o, n�o.

- Bate-me!
- Por favor.

Calca-me e bate-me com
a for�a de um Calmuco.

- Um o qu�?
- Um poderoso guerreiro mongol.

- N�o.
- Preciso de controlo.

- Pare. Largue-me!
- Mais forte.

Usa o chicote. V�, bate-me!
Vamos, eu mere�o!

Bate-me e calca-me!

V�, isso!

� pouco para ti,
mas para mim � o mundo!

- S� tr�s batidas.
- Isso, tr�s!

Bate-me!

Pronto, j� est�.

Olha para isto...
O meu Sokurov estava aqui!

Claire?

- Onde vais?
- � casa dos g�meos.

Eu levo-te l�.
P�e a bicicleta na bagageira.

N�o precisas.

Por favor.

Est� bem.

� para ti. Um presente.

Obrigada, mas n�o quero ter telem�vel.

Porqu�?

- Toda a gente tem.
- Mas eu n�o.

Tivemos uma noite maravilhosa
ou estou totalmente louco?

Sim, maravilhosa.

Ent�o, por que n�o queres
que eu possa ligar-te?

- N�o vejo o que possa ter a ver.
- N�o?

Na verdade, at� vejo muito bem.
Vais come�ar a ligar-me,

depois vais querer saber...

- S� quero saber se imaginas...
- Sam, n�o imagino nada.

Passei a vida a imaginar.
E isso sufocava-me.

Agora eu respiro.

�ptimo, respira, ent�o.
Fico feliz por ti.

J� eu sofro.

- Porque n�o sou tua?
- N�o.

Sim.

Eu estou contigo.
Isso n�o � o suficiente?

Para ti, � f�cil.

N�o � f�cil.

N�o � f�cil n�o ser de ningu�m.

Mas � o que eu quero.

Ent�o, como est� o teu c�o?

Fico feliz por perguntares.
Ele est� bem.

Claire?

Tudo certo para hoje no meu quarto?

Vinte minutos, nada mais.

O Vincent quer que eu ou�a
uma su�te de Bach.

No quarto dele? Vinte minutos?

- Sam.
- O que foi?

Certo, desculpa.

� a Su�te N�1
para Violoncelo Solo de Bach.

Certo, certo.

Fant�stico.

Ent�o at� logo.

N�o est�o a gozar-me com
essa da su�te de Bach, pois n�o?

P�ra de te rir, por favor.
S� sincera.

Sinceramente,
irritas-me com essa tua loucura.

Est� tudo bem?

Merda!

Est�s magoado?

Fant�stico.

- � fant�stico?
- Sim, � fant�stico.

� uma dor verdadeira.

- Est� inchado?
- Ainda n�o.

- Precisas de gelo.
- Ou de ervilhas congeladas.

E preciso de guardar o
meu instrumento dentro da mala.

- O teu qu�?
- O meu violoncelo.

- � claro.
- Preciso de guard�-lo.

C�us, isto foi c�smico.

EST� TUDO BEM,
ELA EST� VIVA

- Est� fria.
- Sim, sim.

A tua pele continua suave.

Como seda.

Sabias que tens um rabo lindo?

J� to disseram antes?

Que eu me lembre, n�o.

Da tua idade, eu era um palito.

Tinha o cabelo curto.

Eu parecia um menino.
Mas tu n�o.

- Acho que estamos a ser espiadas.
- De certeza?

Que tempo maravilhoso!

- O que foi?
- Nada, nada.

Quem est� a�?

- � o Cl�ment. Sei quem �.
- Estava a espiar-nos?

- N�o, n�o estava a espi�-las.
- O que estava a fazer, ent�o?

Estou... a pescar trutas.

E onde tem a cana?

Estou em fase de reconhecimento.

J� que est�s a�, junta-te ao piquenique.

Vem da�!

Importas-te?

- Tens fome?
- Tenho.

- Toma.
- N�o, n�o, eu importo-me!

N�o vou comer com um senhor
que estava a espiar-nos.

Ele n�o � um senhor
e n�o estava a espiar-nos.

E tu acreditas nele?

- N�o faz mal. Vou-me embora.
- N�o, espera.

Ele � meu amigo.
Ele pode comer algo.

Obrigado, Claire,
mas n�o quero incomodar.

Lamento.

Pode ser surpresa,
mas nunca a vi t�o leve, t�o feliz.

� mesmo?

- Irreconhec�vel.
- Como assim?

Est� a ver um caso escaldante.
Ela e o jovem fodem no meio do mato.

E ele n�o � o �nico.

Mora com tr�s homens
no meio do nada, est�s a ver?

Tens a certeza do que est�s a dizer?

N�o parece nada coisa dela.

Estas meninas de hoje em dia
gostam de emo��es fortes.

N�o t�m cora��o.

N�s n�o somos nada assim,
pois n�o, meu querido?

N�o vais dizer nada?

N�o, � que � dif�cil de acreditar.

Ela n�o pode ter mudado tanto.

Mas � verdade.

N�o sabemos a verdade dos outros,
nem se forem pr�ximos,

at� que ta atirem � cara.

N�o vais dizer mais nada?

Reconciliaste-me com o sil�ncio.

N�o falar mais.

Sentir, s� sentir.

Com licen�a, vou roub�-la por
um segundo. Obrigado.

Estou a salvar-lhe a vida.
Est� � beira de uma apoplexia.

Que petul�ncia!

Volta l� para os bra�os dele!

V�-lo envolvido em ti a dan�ar,
d�-me �nsia de matar-vos!

Matar-vos!

N�o faz mal, eu...

Vem dan�ar!

Estou a renascer.

N�o quero arriscar-me a perder tudo
por causa de uma dan�a.

Por uma vez na vida, arrisca!

Vai fazer-te bem!

Escondeu-me o facto de ser
madrasta da Claire.

Mantenha-se em sil�ncio.

Adoro o seu sil�ncio.

Porque � misterioso.

Sinto em si uma mulher feroz e impiedosa.

Estou enganado?

Dois copos de vinho tinto, por favor.

Obrigada.

Desculpe, minha senhora!

- Tu, de novo!
- Desculpe.

- Foi de prop�sito?
- N�o!

Vi que ela n�o gosta de mim
e eu n�o gosto dela.

Ela sorri-te com um olhar frio.
Eu n�o confio nela.

N�o bebo.

S� um bocadinho.

Outro!

� nossa!

N�s n�o dan�amos juntas.

Todos estes homens...

Isto est� bem forte.

E ent�o? Festa � festa!

Mais.

- Est� tudo bem?
- O que tem ela?

- Tenho a cabe�a � roda.
- N�o, est� tudo bem.

Vou lev�-la para casa.

- Vamos.
- Est� tudo � roda...

N�o � preciso, vai ficar tudo bem.

Est�s melhor?

Estou enjoada.

Abranda, n�o estou bem.

Eras uma princesa.

E tornaste-te a rainha.
A rainha dos cora��es.

Deve ser inebriante.

S� tive um amor e tu ficaste com ele.

Roubaste-mo.

Tradu��o e Legendagem
darkdevil